domingo, 29 de novembro de 2009

Dizem

Dizem que a poesia
não tem razão, não tem nexo.
Que é feita traço a traço,
sem trauma e sem complexo.
Veste o homem, despe a alma,
véu por véu até o sexo.

Temporal

Marulho no céu, avião...
Correm nuvens derradeiras.
No telhado, a cumeeira,
abriga aves silenciosas.
Aos riscos fosforescentes,
sai da boca do lixão
a voz do trovão ansiosa...
Meninos impunemente
catam migalhas de pão.

Prece

Que importa se eu sou flor?
Se ele é conde, ela é condessa.
Da Transilvânia ou Oiapoque,
o trem que ali desapareça...
D’encruzilhada, o santo invoque,
convoque o nome que obedeça!
Desde que na paz do rock,
você nunca mais me esqueça...

Insanidade

Lá vai a águia sozinha,
por escolha e condição...
Salva a carne da "rapina",
mas não quer seu coração.

Sofregamente

Sôfrega, a mente amarelecida,
já não mente como antes.
A cada dia, esquecida,
no inferno, é Beatriz, no céu, é Dante.

Lamento

Ela não sabe que eu sei,
se duvidar, eu também.
Estilo e pena não cabem
no dobre do requiem.
Morreu o poeta nobre.
Sem berço foi para o além,
deixou a Terra mais pobre
da poesia de alguém.

Flor-de-ouro

Chuva fina lava as cores.
Flor de sangue, flor de lótus,
Lama da vida sabe a amores...

Perfil

O país é fictício,
como o Brasil também.
O nome, todos sabem
não pertencer a ninguém.
Volta e meia sou menino,
outras vezes me faz bem
ser um cântico divino
ou a sombra do além.

Violetas

Violetas em novembro,
um vento que vai e vem,
"sem lenço e sem documento"
primavera vai além...

Ilusão

A folha caiu ao chão,
se confundiu com o cisco,
mas de lá, feito avião,
ergueu-se em voo e risco...
Ao céu azul, o azulão!

Canoa, canoa...

Há um mundo parado lá fora
Suspenso na medida do tempo
No rio
Tudo é silêncio
E nele não cabe embora
Nem solidão nem canoa

sábado, 28 de novembro de 2009

Aquarela

Saudades brancas
são elas,
daquilo que não vivi.
Demônio e luz,
aquarela,
guache em seda e cetim.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Beija-flor

Desperta o hibisco,
ao bico do passarinho!
Seu voo, em círculo,
seu verso, além do ninho.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Devassa

Naquela tarde na cidade veio a devassa.
Naquele porto em alvoroço
Trilhos passos trens navios...
Era tanto passa passa!

Daquela menina cheia de graça,
O rosto formoso, sem nenhum esforço,
Vento cego jogou no rio...
Era hora do peixe, almoço da garça.

domingo, 22 de novembro de 2009

Cálice

Quero sorver do teu corpo
a liquidez draconiana,
naufragar em teu assombro,
ser tua fala castelhana.

Quero fluir paisagem e gosto,
ser tua voz mais sacana,
anjo que está sempre a posto,
cálice de blasfemia cigana.